Para ler ouvindo: a história do rock lagopratense em uma verdadeira teia de melodias e bandas

(Foto: Gabriel Barbosa/Reprodução da Internet)

Para ler ouvindo: a história do rock lagopratense em uma verdadeira teia de melodias e bandas

Cabal Tribal, Língua de Musquito, Sapo Antunes, Bicho Mecânico de Asas, Green Grass… se você é um frequentador da cena musical alternativa de Lagoa da Prata há mais ou menos tempo, já deve ter ouvido alguns desses nomes. 

Para o Dia Mundial do Rock, o Sou+Lagoa conversou com músicos e compositores do rock lagopratense em atividade até hoje, e buscou traçar uma parte da história da cena na cidade. Muitos nomes, bandas, melodias e histórias ajudaram a construir tantos movimentos musicais e culturais que agregam Lagoa da Prata até os dias de hoje. 

Ainda no outro milênio, nomes como a Língua de Musquito surgiram para expandir todas as fronteiras da música lagopratense. Se lembra?

“A Língua de Musquito foi criada em meados de 1999, e durou até 2015. Surgiu no ensaio que a gente foi assistir de uma banda chamada Arame Farpado, que era daqui de Lagoa, e a gente resolveu que ia lá fazer um som. Um amigo tinha os instrumentos, eu bati em uns baldes lá e fizemos uns pop rock nacional: Paralamas [do Sucesso], Engenheiros [do Hawaii], Capital [Inicial]. E aí surgiu a banda! Língua de Musquito, tem uma música do pai do Cassiano, que ele compôs em 1972, e a gente resolveu dar esse nome pra banda”, contou o baterista Daniel Ribeiro, conhecido como Bel. 

Bel disse que a banda passou por várias formações. Foi criada por ele ao lado de Cassiano Abílio e André Almeida, e depois recebeu outros integrantes. Membros como David Ribeiro, Duguinha, Vitor Borges, Hélder Clério e George Bernardes, ligados à música e outras atividades culturais em Lagoa da Prata, passaram pela Língua de Musquito. 

Enquanto a Língua de Musquito ainda respirava, outra banda surgia na cena do rock lagopratense e se preparava para ocupar o seu espaço por décadas.

“A Cabal Tribal foi criada em meados de 2002. Existia uma banda chamada Banda Vabso, e os integrantes que criaram a Cabal Tribal faziam parte dessa banda: Fabinho e Alisson. Montaram a Cabal Tribal, fizeram vários shows, se destacaram na região, lançaram um disco entre 2003 e 2004. Teve boa repercussão esse disco, com músicas autorais. Eu fui tocar na banda no final de 2009; eu entrei como roadie e ajudava a banda também em algumas questões na produção, e depois comecei a fazer percussão até que eu fui também pro palco tocar”, relatou o baterista.

Em 2016, aconteceu o evento Rock in Peace em homenagem a Alisson, primeiro baterista da banda. 

“Com a doença do Alisson, um dos criadores da banda junto com o Fabinho, a banda deu uma parada durante um tempo. Depois o Fabinho montou novamente uma formação com outros músicos, e eu fui pra bateria e toquei de 2016 até 2022”, falou Bel.

Douglas Silveira, conhecido como Duguinha, é nome frequente na história de grande parte das bandas. Multi instrumentista e compositor, é responsável pelas letras de músicas como “Se Lembra” e “Me Deixa“, da Língua de Musquito. Compôs as guitarras de “Fronteira”, com letra de Helder Clério, verdadeiro primor da música lagopratense.

“Eu comecei indo lá no clube recreativo curtindo as bandas lá que tocavam: Os Intocáveis, Arame Farpado… Na época não sabia nem tocar, mas daí surgiu o interesse, né, de querer tocar, de querer tá lá igual”, contou. Ele ainda ressaltou que via esses músicos como “seus heróis” e que, até hoje, são suas influências. 

Em meados de 2002, se tornou baixista da Língua de Musquito e fez parte da banda em diversas fases ao longo dos anos.

O nome Língua de Musquito também carrega uma história. Em 1972, o pai do guitarrista Cassiano, Antônio Alves Ferreira, conhecido como Titonho, compôs uma música de mesmo nome. Mais tarde, foi regravada por Jales Macalé em 1994 na versão de samba. Mais tarde, a própria Língua de Musquito gravou sua versão punk rock durante suas produções.

 

Duguinha
(Foto 1: Gabriel Barbosa / Foto 2: Daniel Ribeiro)

Em meados de 2008, Duguinha procurou por Fabinho para voltar aos palcos com a Cabal Tribal, que havia passado por uma dissolução. Junto ao baterista Alisson Caetano, retomaram as atividades da banda.

“Aí começou todo final de semana fazendo show. Foi bem intensa a coisa aí. Parei de tocar com eles e voltei com a Língua de Musquito. Aí a gente voltou, fez show lá na PUC de Belo Horizonte… a gente foi convidado pra um monte de coisa, fez programa de rádio, gravou quatro músicas, que tem um EP”, relatou Duguinha. 

Nessa época, George Bernardes integrava a banda e falou que sua experiência na Língua de Musquito foi o momento de agregar outros estilos ao seu repertório musical.

“Eu recebi o convite para tocar na Língua de Musquito, uma banda que eu sempre fui fã aqui de Lagoa. Era eu na guitarra e voz, era o Duguinha na guitarra e voz, o Helder Clério no baixo e voz, o André Laine no teclado e voz, e o Bel na bateria. E a gente fazia ali um mix de cantar as músicas. Eu cantava uma música, o Duguinha cantava uma música, o Hélder cantava uma música, o André Laine cantava uma música, e também tocava saxofone. E essa época da Língua de Musquito foi muito importante para mim, foi onde eu expandi a minha mente nos estilos musicais, né? Então, tanto o rock, quanto também qualquer outro estilo, foi ali onde eu expandi. Ali eu conheci Milton Nascimento, Clube da Esquina, o MPB, né? Essa minha experiência com a Língua de Musquito foi importante demais para mim”, disse. 

Nessa fase, a banda se apresentou por duas vezes que são apontadas pelos ex membros da banda como memoráveis. Se apresentaram por uma vez no All Black Pub, e na PUC Minas de Belo Horizonte. 

“Enquanto a gente tocava, parecia que era no intervalo, mas certas aulas que não tinham intervalo, a galera lá das janelas dos prédios da PUC, vendo a gente. Também participei da gravação de duas músicas, que era a “Eu sou estranho” e a “Me deixa”, guitarra e voz também, segunda voz”, finalizou.

Algum tempo depois, a banda também acabou passando por uma dissolução. 

“Como a coisa não dá dinheiro, é fácil dissolver, cada um vai correr atrás do que mais lhe convém. Nesse intervalo da Língua de Musquito eu fui tocar em bandas de baile, flashback, essas coisas. Aí eu já estava fazendo música já, as músicas antigas que eu já fazia, que tinha tudo a ver com o Pé Vermelho Rock Blues, que era uma mistura… nada de inovador, é rock antigo mesmo, rock setentista. A gente também fez alguns shows lá com Pé Vermelho e agora estamos voltando a gravar”, relatou Duguinha, traçando um panorama até os dias atuais. Em breve, a Pé Vermelho Rock Blues divulgará seus novos trabalhos autorais. 

Quando questionado sobre as mudanças no cenário alternativo até a atualidade, sejam positivas ou negativas, Duguinha disse que vê uma desconexão. 

“Acho que o rock n’ roll mesmo perdeu um pouquinho de conexão com a juventude, com o moleque de 14, 15, 16 anos. Acho não, tenho certeza. Não sei se o rock vai voltar a ser mainstream, se vai voltar a ser ‘pop’ não. A não ser que alguém surja aí e consiga conectar o rock com a juventude, com o jovem de hoje”, falou. 

Na última edição do Moto Sunset, Duguinha fez uma participação especial no show da banda Green Grass, que se apresentava pela primeira vez no palco principal do evento.

“Foi muito bom. Eu fiquei bastante comovido pelo convite deles, né? E agora numa outra fase da minha vida também”, finalizou o músico.

A Green Grass, fundada em meados de 2013, é uma banda em constante ascensão no rock lagopratense. Fundada inicialmente como uma banda de escola, cresceu de forma consistente a partir da segunda formação. 

“A Green Grass sempre foi um desejo meu do meu irmão de fazer uma banda. Então, como ele não estava presente naquela época [de escola], eu não considero não. A gente curtiu pra caramba, sabia tocar os instrumentos razoavelmente bem, já tinha uma noçãozinha ali. Aí ficou eu, Gu [Gustavo Oliveira] e como meu irmão já sabia tocar, virou a Green Grass, que ainda não tinha nome”, contou George. 

O músico destacou que o nome surgiu em uma roda de amigos em meio a um ‘brainstorm’, no qual sugeriram Green Grass e a sonoridade agradou os membros da banda, que assim é chamada até hoje. 

“O nosso primeiro show foi em 2013. Acho que era um ensaio aberto no [Rei do] Mocotó. Éramos totalmente inexperientes, não sabíamos de nada ainda, não tinha instrumento direito. E a gente fez um show que a galera surpreendeu com o repertório, porque até então nenhuma banda de Lagoa tocava as músicas que a gente tocou naquele dia. A galera curtiu, apesar de que a gente era muito inexperiente. A gente foi continuando, né? Desde então a gente fez vários shows aqui na cidade, vários no Rei do Mocotó, a gente fez um show do lado da ‘igreja da matriz’. A gente tocou também nos encontros de motociclistas, isso em 2013, 2014, no palco alternativo. Em 2015 continuamos com a mesma formação, eu, meu irmão, e Gu. Tocamos no encontro de motociclistas e tal e esse foi esse foi o último show com essa formação”, relatou o vocalista.

A banda entrou em hiato por um tempo, até receber um novo baterista. Fernando Borges, que integrava a banda Sapo Antunes e, atualmente, baterista da Cabal Tribal. Com essa formação, a banda se apresentou duas vezes. Uma delas, em uma das edições do Pequenas Intervenções, promovido pelo Coletivo Nexalgum. Após esses eventos, a banda entrou em hiato até o ano de 2018.

“A gente voltou no encontro de motociclistas de 2018. A gente fez um show com a formação original. Eu, meu irmão e o Gu fizemos um show no palco alternativo. Foi bem bacana, mas foi só um show de reunião da banda mesmo”, contou George. 

O hiato continuou até 2020. No meio tempo, George integrou a Volta Elétrica, que encerrou suas atividades em meados de 2019. 

“A minha experiência na Volta Elétrica também foi muito boa. Eu tive a experiência de trabalhar com uma banda que levava mais a sério, sabe, levava mais a sério os ensaios semanais, os shows. Era um profissionalismo maior do que nas outras bandas que eu tinha participado. Foi uma experiência boa para mim também no quesito profissionalismo. Ali já era o Vitor Borges, o David [Ribeiro] e eu entrei ali para acrescentar, incrementar o show deles. A Volta Elétrica fez vários toda a região, de 2016 a 2019”, contou George.

Com a saída de Vitor Borges da banda em 2018, George assumiu os vocais principais e contou ter sido um grande desafio. 

“Depois que o Vitor saiu, a Volta Elétrica quis arriscar um estilo diferente daquele que eles já estavam acostumados a tocar, aquele rock n’ roll brasileiro estilo Barão Vermelho, e eles queriam mudar, ir mais pra vibe do indie rock. A gente fez um show no Lacustre de 2018, remodelou todas as músicas que eles tinham gravado pra esse novo estilo da Volta Elétrica e apresentamos duas músicas inéditas, que a gente criou já comigo na banda. Músicas que foram compostas pelo Helder e o Duguinha, e a gente fez o ritmo, a melodia e tal. A Volta Elétrica terminou em 2019, E a pandemia ajudou muito nesse término da banda”, finalizou George.

Ainda nos palcos 

A Green Grass retornou do hiato durante a pandemia, e recebeu novos membros.

“Estava todo mundo paradão e a gente começou a ensaiar na casa do meu irmão. Eu, o Gu e meu irmão, até que eu tive a ideia de chamar o Caio, que tocava com a Metáfora, pra tocar conosco. Eu sempre achei, desde o início, que a gente precisava de outro guitarrista. Ensaiamos, ensaiamos e depois o Gu saiu da banda de novo, porque ele foi trabalhar, e chamamos o Fernando de novo. Foi massa”, recordou George.

Nessa fase, as músicas autorais começaram a surgir, reformando trabalhos antigos. Apesar disso, os shows não estavam acontecendo devido à pandemia. No retorno aos ensaios e, mais tarde, aos palcos, a banda contou com a participação de Bel na bateria, após a saída da banda Cabal Tribal.

“O Bel seria super importante pra banda, porque o Bel é um cara que tem muita bagagem, tem muita experiência. E eu já tinha sinergia com ele, desde a época da Língua de Musquito, dos acústicos. Aí a formação ficou eu, o Bel, o Caio e o [João Vitor] Gunner, que é a atual”, explicou George.

Em novembro de 2021, a Green Grass fez o seu retorno oficial em um encontro de motociclistas em Lagoa da Prata, o “Bora Bora de Moto”. Trouxeram músicas do repertório clássico da banda e acrescentaram novidades, com o objetivo de chamar mais a atenção do público e ganhar visibilidade. Desde então, é o que vêm fazendo em Lagoa da Prata e diversas cidades da região.

Duguinha também participou das bandas Bicho Mecânico de Asas (Bima) e Volta Elétrica, em épocas distintas. A Bicho Mecânico de Asas, carinhosamente apelidada de Bima, continua em atividade e fortalece o rock progressivo na cena lagopratense. Um dos membros presentes, Hugo Ferreira, tocava paralelamente na Cabal Tribal, que manteve as atividades desde a nova formação.

“A Bima, se eu não me engano, começou no hiato aí das duas formações da Sapo Antunes. Começou comigo, a Debs [Rezende] e o Hugo. Depois que Sapo Antunes parou, aí veio essa formação [atual]”, contou Carol Shineider, musicista lagopratense, sobre a formação da Bicho Mecânico de Asas.

“A Bicho Mecânico já era formada pela Débora, Hugo, Carol, até que eu fui convidado pra tocar bateria por volta de 2012. E assim ficou a formação: eu na bateria, Carol no violão e vocal, Hugo na guitarra. Eu fazia também um pequeno sintetizador analógico. Depois a banda foi tendo outras formações, entrou um baixista, o Vinícius, depois o Duguinha, até que entrou o Mudo. Lançamos alguns EPs, alguns singles, fizemos parte de alguns festivais de música em Belo Horizonte, Contagem, Lagoa da Prata, Arcos, Bom Despacho. Perdura até hoje, a banda tá em formulação mas não demora muito e estaremos em atividade novamente”, disse Bel.

Vinicius Pereira, mencionado como baixista da Bima, também contribuiu em bandas como a Pé Vermelho Rock Blues. De 2014 até os dias atuais, integra a banda Metáfora, que ao lado de Green Grass, Bicho Mecânico de Asas, Cabal Tribal e outras bandas, permitem que o rock continue respirando em Lagoa da Prata.

Moto Sunset
(Foto: Vinícius Pereira/Arquivo Pessoal)
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Ana Isa