A barbárie “ostentada” e a cultura do estupro. Até quando?
O país acordou estarrecido na manhã do dia 26 de maio, quando todos os meios de comunicação e redes sociais estampavam a história da garota de 16 anos que foi vítima de um estupro coletivo em uma comunidade do Rio de Janeiro. Não bastasse a barbárie, fotos e vídeos do fato foram publicados por indivíduos que participaram do crime. Eles se vangloriavam da tal “façanha” e zoavam a menina nua, dopada e machucada, estirada numa cama. Para piorar, as imagens foram amplamente compartilhadas por outros usuários e não demorou provocar a ira e a revolta de muitas pessoas, que bombardearam a ouvidoria do Ministério Público com centenas de denúncias.
Os criminosos jogam na cara da sociedade brasileira duas verdades cruéis: primeiro, a certeza da impunidade, a despreocupação total com a justiça e com as consequências de seus atos. Além disso, o orgulho que eles estampam no vídeo pelo crime praticado é uma prova do quanto a violência contra a mulher é vista de forma “natural” neste país.
Casos como esse, que muitas pessoas pensam que só ocorre na Índia, infelizmente, são mais comuns por aqui do que se imagina. Há cerca de 1 ano, no Piauí, quatro adolescentes foram vítimas de estupro coletivo e jogadas de um penhasco. De acordo com dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil registrou 47.646 casos de estupros em 2015.
Por mais absurdo que pareça, está enraizado na nossa cultura que o corpo da mulher é algo para se usufruir livremente. Há também a crença de que a própria mulher é a causadora de tudo! Prova disso são os comentários que ouvimos e lemos, diariamente, de homens e (pasmem!) mulheres que dizem que se a mulher foi estuprada, com certeza fez algo que provocasse isso. Ou seja, a vítima é a culpada! “A roupa estava curta, “o decote estava muito ousado”, “frequenta baile funk/barzinho/balada e dança, bebe, se diverte.”. Logo, “está pedindo mesmo para ser estuprada!”
A menina de 16 anos que foi encontrar o namorado e se divertir naquela noite, poderia ter sido sua filha indo para um barzinho popular na cidade ou para a casa de amigos… poderia ser a sua namorada, irmã, vizinha, amiga encurralada em uma rua escura e pouco movimentada, poderia ser a mãe dos seus filhos,ao descer do carro, na porta de casa, sem ter tido tempo de gritar por ajuda. Poderia ser eu, poderia ser qualquer uma de nós. Chega! A culpa não é da mulher! A culpa é sempre, indubitavelmente, do estuprador. Enquanto aceitarmos e corroborarmos com concepções ignorantes e retrógradas como essa, estaremos fadados a assistir, cotidianamente, seja nos jornais ou em nossa cidade, atos desumanos como o dessa menina carioca.
(Ironicamente, a mídia dividiu sua atenção com um outro fato: o ator Alexandre Frota – sim, aquele que confessou, em 2015, em tom de piada, ter abusado sexualmente de uma mulher – foi recebido pelo ministro interino da Educação, Mendonça Filho, para, segundo o próprio Frota, discutir algumas ideias para “ajudar o país”. Medo!)
Nos resta cobrar dos órgãos competentes uma punição exemplar a estes monstros! Que a mudança de mentalidade comece por cada um de nós, exigindo respeito ao corpo e aos direitos das mulheres. Que não nos calemos ao tomar conhecimento de que uma mulher foi ou vem sendo vítima de violência física e psicológica. A denúncia pode ser feita em qualquer delegacia de polícia, no Ministério Público, ou pela Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180). Quem cala é cúmplice!